segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Inveja

Tempos de assumir pecados e defeitos. Um deles é a inveja, ainda que quase sempre ligada à arte, nunca a coisas materiais. Invejo Ruy Guerra pelo texto abaixo, que eu gostaria muito de ter escrito. Assumo e publico:

Sabe, no fundo eu sou um sentimental.
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo ( além da sífilis, é claro). Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar, o meu coração fecha os olhos e sinceramente chora...

Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto,
De tal maneira que, depois de feito,
Desencontrado, eu mesmo me contesto.

Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intenção e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito,
Me assombra a súbita impressão de incesto.

Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadora à proa,
Mas meu peito se desabotoa.

E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa,
Pois que senão o coração perdoa.

Ruy Guerra


Postado por Zé Mauro Nogueira, um invejoso




Murilo - amigo

Já melhorei muito, mas nunca fui um tipo fácil no trabalho. No meu modo de ver, objetividade e exigência pelo melhor; no modo de ver dos outros, arrogância e intolerância. Não há uma verdade, apenas pontos de vista diferentes.

Lá pelo início da década passada trabalhei com uma empresa de assessoria de imprensa formada por duas sócias. Uma delas (ou as duas rs) claramente não ia com a minha cara. E eu a achava meio de nariz empinado também, confesso. Mas nada de sério, apenas uma tensão leve no ar.

Alguns anos depois, estou num bar tomando um whisky com um amigo, discutindo qualquer coisa filosófica, quando um sujeito sentado no balcão interfere, acho que dá uma risada, não lembro mais. Meu amigo, que já o tinha visto não sei onde, o convida para a mesa.

Papo bom, conversa vai, conversa vem, o intruso vira pra mim e pergunta – Você é o Mauro que trabalhava na Liga? – Putz, pensei, lá vem bomba, quer ver? – Eu sou o Murilo, ex marido de beltrana, que fez assessoria de imprensa pra Liga, lembra?


Dei um sorriso amarelo e pensei que já era, a conversa ia azedar. Mas, para minha surpresa e alívio, o cara era do bem total e anos passados desse dia, continuamos a tomar umas e outras e a discutir a vida. Já tivemos dias melhores, mas tudo muda e um dia encontraremos a calmaria, afinal, como dizem nossos amigos, somos do bem.

Zé Mauro Nogueira


Luís Cláudio - amigo

Visão geral do meu início de 1987, segundo ano de Universidade: em recuperação de um tifo, pele e osso, pesando 66kg, com o cabelo bem ralo de tanto que caiu com as semanas de febre, sem dinheiro pra nada e sem lugar pra morar em Florianópolis. Não me lembro de ter estado tão na merda.

Quando finalmente arrumei um lugar pra ficar, num apartamento na Av. Mauro Ramos onde já moravam outros cinco caras, topei com um gaúcho aluno de educação física que virou pra mim e disse: “Bah, negão, tu tá precisando botar uma carninha nesses ossos! Vou te dar uma mão”.

A gente arrumou uma academia baratinha e passamos a caprichar na comida. O almoço era no restaurante universitário, mas à noite e pela manhã sempre tinha alguma coisa pra pesar no estômago: litros de vitaminas de banana que eram verdadeiras bombas, panelas de polenta ou de lentilha, ou qualquer outra coisa que “desse sustância”.

Em poucos meses começou a dar resultado. No corpo e na auto estima. Esse ano acabaria como um dos mais importantes da minha vida, descobri um jeito novo de me colocar no mundo e adquiri uma confiança que me acompanharia por muito e muito tempo.

O gaúcho marrento voltou para Torres e aprecia sua pacata vida mansa com a mulher e o filhote, que, finalmente, resolveu trazer ao mundo. Merecida paz, gaudério. Se ler isso daqui, obrigado por tudo!


Zé Mauro Nogueira