quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Jarbas - amigo

Eu ia fazer treze anos quando fui morar em Gaspar (SC), pertinho de Blumenau. Tinha trocado a indígena Belém por uma pequena e conservadora cidade alemã e nada poderia ser mais estranho. Meu sotaque, minha cor, meus cabelos desgrenhados e compridos, meu pai que morava com a então mulher e uma ex na mesma casa, enfim, eu era quase uma atração circense.

O que salvou foi o futebol e acabei fazendo alguns amigos. Entre eles o Jarbas, um alemão sardento e baixinho, completamente doido que, por alguma razão, foi com a minha cara. Além de jogar bola e experimentar todo tipo de bebida alcoólica, o que mais nos interessava era passar a mão na bunda das meninas e tentar beijá-las em qualquer ocasião minimamente favorável. Como diria Chico Buarque, os pais delas não gostavam da gente.

Um dia ele chega e dispara: Negão, tô com dinheiro, vamos para Itajaí ver os jogos abertos? Pegamos o ônibus e fomos sem avisar ninguém. Lá pelas 22h, quando chegou a hora de voltar, notei que ele desconversou, ficou esquisito, eu sabia que tinha coisa errada. O maluco só tinha o dinheiro da ida. Frio, fome, sono e a 40km longe de casa.

Nem lembro o que pensamos ou porque fomos parar na entrada do porto de Itajaí, mas, sentados lá, aconteceu uma das coisas mais estranhas da minha vida: desceu um cara cabeludo de um táxi, falou qualquer coisa em “russo” e acabou nos dando uma graninha. Quando amanheceu pegamos o primeiro ônibus de volta a Gaspar.

Recentemente, lembrando dessa história, tive a ideia de tentar achar o paradeiro do Jarbas quase 30 anos depois. Tristeza e profunda reflexão se seguiram à descoberta de que meu amigo perdido de infância se tornou paciente psiquiátrico. Só que agora não é de brincadeira. O que alivia é que, algumas vezes quando penso nisso, ainda acho que o maluco sou eu.

Zé Mauro Nogueira